Meu pai da mesma idade confessou que continuaria a escrever seus poemas à máquina,
já era tarde para mudar.
A mesma mãe chega agora a me pedir que entre no MSN para conversar com ela.
Quase tive um troço ao receber suas carinhas amarelas na caixa de diálogo.
Pode? O mesmo pai passa dias escolhendo a letra de seu livro no computador,
até faz as capas dos seus livros e monta imagens.
Pode? Quem ensinou eles não fui eu, nem meus irmãos.
Foram meus filhos ou filhos da Carla, seus netos.
Ficava louco de receio de que a tecnologia aprisionasse as crianças e as convertesse em protótipos egoístas.
A tecnologia aproximou a família. Os pequenos são nossos professores. Aprendem com os colegas e repassam seus conhecimentos com um destemor invejável.
Eles não querem seguir à frente, são generosos, vêm nos buscar para acompanhá-los.
Há uma bondade em não deixar ninguém sem saber menos.
Uma troca que não existia antes.
Por exemplo, eu não aprendi a datilografar em casa.
Mandaram-me para um curso das regras da ABNT.
Sovei as teclas durante seis meses, para receber um diploma aos 15 anos.
Hoje eu ensino meu filho de cinco anos a teclar,
sem a necessidade de sofrer com a histeria de um compromisso.
A tecnologia é lazer aos filhos, prazer, extensão dos dedos, não trabalho e sacrifício como eu e meus pais enxergavam o assunto, com pavor dos cursos e dos testes.
Essa é a diferença: eles estão brincando, nós estávamos projetando uma carreira.
Quem dará mais certo? Eles, óbvio.
Não é a geração do constrangimento, é a geração do desembaraço.
Comunica-se mais cedo, utiliza o mouse como se fosse a corda de um pião,
define um jeito de economizar dentro das opções da rede.
Filhos são download gratuito.
Quem me enxerga de I-Pod na rua pode acreditar que sou malandro.
Um careca fazendo mímica na rua.
Mas não pense que baixei sozinho as músicas em meu aparelho.
Minha filha Mariana, 14 anos, me ajudou a instalar o programa e escolheu boa parte do repertório. O único inconveniente são as músicas. Meus ouvidos estão plugados nos seus gostos. Temo até mostrar os headphones para terceiros. Vão pensar que estou em crise de meia-idade. Mas como os filhos nos ensinam os macetes e os acessos, entendemos o que gostam,
o que admiram, o que querem. É mais fácil de orientar.
Não é mais cada um em seu quarto, é o quarto conectado a todos os quartos.
Já sei a gíria do adolescente, já sei toda a programação do Discovery Kids.
Sento para assistir desenhos com o Vicente, comento, pesco o que ele está pescando, percebo os momentos de sua curiosidade e o que o faz tremer de rir.
Ainda ele corrige a pronúncia de meu inglês. Pode?
Não há horários pré-estabelecidos, há respeito pela individualidade.
Assim como meu futebol, o seriado ou a animação de meus filhos são sagrados.
Não é tudo ao mesmo tempo, mas todos ao mesmo tempo.
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