quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Cuida de mim - O Teatro Mágico

Pra falar verdade,
às vezes minto
Tentando ser metade
do inteiro que eu sinto
Pra dizer as vezes
que às vezes não digo
Sou capaz de fazer
da minha briga meu abrigo
Tanto faz não satisfaz
o que preciso
Além do mais,
quem busca nunca é indeciso
Eu busquei quem sou;
Você, pra mim, mostrou
Que eu não sou sozinho nesse mundo.
Cuida de mim enquanto não esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo que sou quem eu queria ser.
Cuida de mim enquanto não me esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo, enquanto fujo.
Basta as penas que eu mesmo sinto de mim
Junto todas, crio asas, viro querubim
Sou da cor, do tom, sabor e som que quiser ouvir
Sou calor, clarão e escuridão que te faz dormir
Quero mais, quero a paz que me prometeu
Volto atrás, se voltar atrás assim como eu.
Busquei quem sou
Voce, pra mim, mostrou
Que eu não estou sozinho nesse mundo.
Cuida de mim enquanto não esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo que sou quem eu queria ser.
Cuida de mim enquanto não me esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo, enquanto fujo.

Composição: Fernando Anitelli

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

O RIO - desconheço o autor... lamentável !

E o rio corre sozinho.
Vai seguindo seu caminho.
Não necessita ser empurrado.
Pára um pouquinho no remanso.
Apressa-se nas cachoeiras.
Desliza de mansinho nas baixadas.
Precipita-se nas cascatas.
Mas, no meio de tudo isso vai seguindo seu caminho.
Sabe que há um ponto de chegada.
Sabe que seu destino é para a frente.
O rio não sabe recuar.
Seu caminho é seguir em frente.
É vitorioso, abraçando outros rios, vai chegando no mar.
O mar é sua realização.
É chegar ao ponto final.
É ter feito a caminhada.
É ter realizado totalmente seu destino.
A vida da gente deve ser levada do jeito do rio.
Deixar que corra como deve correr.
Sem apressar e sem represar.
Sem ter medo da calmaria e sem evitar as cachoeiras.
Correr do jeito do rio, na liberdade do leito da vida, sabendo que há um ponto de chegada.
A vida é como o rio.
Por que apressar?
Por que correr se não há necessidade?
Por que empurrar a vida?
Por que chegar antes de se partir?
Toda natureza não tem pressa.
Vai seguindo seu caminho.
Assim é a árvore, assim são os animais.
Tudo o que é apressado perde o gosto e o sentido.
A fruta forçada a amadurecer antes do tempo perde o gosto.
Tudo tem seu ritmo.
Tudo tem seu tempo.
E então, por que apressar a vida da gente?
Desejo ser um rio.
Livre dos empurrões dos outros e dos meus próprios.
Livre das poluições alheias e das minhas.
Rio original, limpo e livre.
Rio que escolheu seu próprio caminho.
Rio que sabe que tem um ponto de chegada.
Sabe que o tempo não interessa.
Não interessa ter nascido a mil ou a um quilômetro do mar.
Importante é chegar ao mar.
Importante é dizer "cheguei".
E porque cheguei, estou realizado.
A gente deveria dizer: não apresse o rio, ele anda sozinho.
Assim deve-se dizer a si mesmo e aos outros: não apresse a vida, ela anda sozinha.
Deixe-a seguir seu caminho normal.
Interessa saber que há um ponto de chegada e saber que se vai chegar lá.
É bom viver do jeito do rio!

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Pequeno trecho de Mário Quintana

Os sonhos têm luz própria, uma luz que não vem de nenhum sol,
de nenhuma lua, de nenhum foco.
Está em toda parte.
Na próxima vez que sonhares,
procura ver se o teu vulto projeta alguma sombra.
E se a tua imagem se reflete n'algum espelho.
Tolice minha! Nos salões do sonho nunca há espelhos...

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Trecho de Lya Luft

"...Para viver de verdade, pensando e repensando a existência,
para que ela valha a pena, é preciso ser amado; e amar; e amar-se.
Ter esperança; qualquer esperança.
Questionar o que nos é imposto, sem rebeldias insensatas mas sem demasiada sensatez. Saborear o bom, mas aqui e ali enfrentar o ruim.
Suportar sem se submeter, aceitar sem se humilhar,
entregar-se sem renunciar a si mesmo e à possível dignidade.
Sonhar, porque se desistimos disso apaga-se a última claridade e nada mais valerá a pena. Escapar, na liberdade do pensamento,
desse espírito de manada que trabalha obstinadamente para nos enquadrar,
seja lá no que for.
E que o mínimo que a gente faça seja, a cada momento, o melhor que afinal se conseguiu fazer."

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Prece - Clarice Lispector


"Alivia a minha alma, faze com que eu sinta que Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar é não morrer, que a entrega de si mesmo não significa a morte, faze com que eu sinta uma alegria modesta e diária, faze com que eu não Te indague demais, porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta, faze com que me lembre de que também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe e no entanto ele quer e no entanto o beijo é perfeito, faze com que eu receba o mundo sem receio, pois para esse mundo incompreensível eu fui criada e eu mesma também incompreensível, então é que há uma conexão entre esse mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós enquanto quisermos entendê-la, abençoa-me para eu viva com alegria o pão que eu como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade por mim mesma, pois senão não poderei sentir que Deus me amou, faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana amada para apertar a minha, amém."

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Conhecer-me - Álvaro Campos (heterônimo de F.Pessoa)

Começo a conhecer-me.
Não existo.
Sou o intervalo entre o que desejo ser
e os outros me fizeram,
ou metade desse intervalo,
porque também há vida ...
Sou isso, enfim ...
Apague a luz,
feche a porta
e deixe de ter barulhos de chinelos no corredor.
Fique eu no quarto só com o grande sossego de mim mesmo.
É um universo barato.

Tenho tanto sentimento - Fernando Pessoa

Tenho tanto sentimento
Que é freqüente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.

Saudade - Clarice Lispector

Saudade é um pouco como fome.
Só passa quando se come a presença.
Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco:
quer-se absorver a outra pessoa toda.
Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira
é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Diálogo - Cecília Meirelles

Minhas palavras são a metade de um diálogo obscuro continuando através de séculos impossíveis.
Agora compreendo o sentido e a ressonância que também trazes de tão longe em tua voz.
Nossas perguntas e resposta se reconhecem como os olhos dentro dos espelhos.
Olhos que choraram. Conversamos dos dois extremos da noite, como de praias opostas.
Mas com uma voz que não se importa...
E um mar de estrelas se balança entre o meu pensamento e o teu.
Mas um mar sem viagens.

Ama-me por amor somente... Madre Teresa de Calcutá


"Ama-me por amor somente.
Não digas: "Amo-a pelo seu olhar,
O seu sorriso,
o modo de falar honesto e brando.
Amo-a porque se sente Minh'alma em comunhão constantemente com a sua.
Porque pode mudar isso tudo, em si mesmo, ao perpassar do tempo, ou para ti unicamente.
Nem me ames pelo pranto que a bondade
de tuas mãos enxuga, pois se em mim secar,
por teu conforto, esta vontade se chorar, teu amor pode ter fim!
Ama-me por amor do amor, e assim
Me hás de querer por toda a eternidade"

Loucura e lucidez - Lya Luft

Já não procuro a palavra exata que me pudesse explicar:
ando pelos contornos onde todos os significados são sutís,
são mortais.
Não busco prender o momento belo:
quero vivê-lo sempre mais com a intensidade que exige a vida,
com o desgarramento do salto e da fulguração.
E me corto ao meio e me solto de mim,
duplo coração:
a que vive,
a que narra,
a que se debate e a que voa- na loucura que redime da lucidez.