terça-feira, 30 de junho de 2009

Trilha de contradições - Lya Luft

"Viver é subir uma escada rolante pelo lado que desce."
Já escrevi sobre essa frase. Sim, repito alguns temas, que são parte do meu repertório,
pois todo escritor, todo pintor, tem seus temas recorrentes.
No alto dessa escada nos seduzem novidades e nos angustia o excesso de ofertas.
Para baixo nos convocam a futilidade, o desalento ou o esquecimento nas drogas.
Na dura obrigação de ser "felizes", embora ninguém saiba o que isso significa, nossos enganos nos dirigem com mão firme numa trilha de contradições.
Apregoa-se a liberdade, mas somos escravos de mil deveres.
Oferecem-nos múltiplos bens, mas queremos mais. Em toda esquina novas atrações, e continuamos insatisfeitos. Desejamos permanência, e nos empenhamos em destruir.
Nós nos consideramos modernos, mas sufocamos debaixo dos preconceitos, pois esta nossa sociedade, que se diz libertária,
é um corredor com janelinhas de cela onde aprisionamos corpo e alma.
A gente se imagina moderno, mas veste a camisa de força da ignorância e da alienação,
na obrigação do "ter de":
ter de ser bonito, rico, famoso, animadíssimo, ter de aparecer – que canseira.
Como ficcionista, meu trabalho é inventar histórias; como colunista, é observar a realidade,
ver o que fazemos e como somos. A maior parte de nós nasce e morre sem pensar em nenhuma das questões de que falei acima, ou sem jamais ouvir falar nelas.
Questionar dá trabalho, é sem graça, e não adianta nada, pensamos.
Tudo parece se resumir em nascer, trabalhar, arcar com dívidas financeiras e emocionais,
lutar para se enquadrar em modelos absurdos que nos são impostos.
Às vezes, pode-se produzir algo de positivo, como uma lavoura, uma família, uma refeição,
um negócio honesto, uma cura, um bem para a comunidade, um gesto amigo.
Mas cadê tempo e disposição, se o tumulto bate à nossa porta, os desastres se acumulam
– a crise e as crises, pouca trégua e nenhuma misericórdia.
Angústias da nossa contraditória cultura: nunca cozinhar foi tão chique, nunca houve tantas delícias, mas comer é proibido, pois engorda ou aumenta o colesterol.
Nunca se falou tanto em sexo, mas estamos desinteressados, exaustos demais, com medo de doenças. O jeito seria parar e refletir, reformular algumas coisas, deletar outras – criar novas, também. Mas, nessa corrida, parar para pensar é um luxo, um susto, uma excentricidade, quando devia ser coisa cotidiana como o café e o pão.
Para alguns, a maioria talvez, refletir dá melancolia,
ficar quieto é como estar doente, é incômodo, é chato:
"Parar para pensar? Nem pensar! Se fizer isso eu desmorono".
Para que questionar a desordem e os males todos, para que sair da rotina e querer descobrir um sentido para a vida, até mesmo curtir o belo e o bom, que talvez existam? Pois, se for ilusão, a gente perdeu um precioso tempo com essa bobajada, e aí o ônibus passou, o bar fechou, a festa acabou, a mulher fugiu, o marido se matou, o filho... nem falar.
Então vamos ao nosso grande recurso: a bolsinha de medicamentos. A pílula para dormir e a outra para acordar, a pílula contra depressão (que nos tira a libido) e a outra para compensar isso (que nos rouba a naturalidade), e aquela que ninguém sabe para que serve, mas que todo mundo toma. Fingindo não estar nem aí, parecemos modernos e espertos, e queremos o máximo: que para alguns é enganar os outros; para estes, é grana e poder, beleza e prestígio;
para aqueles, é delírio e esquecimento.
Para uns poucos, é realizar alguma coisa útil, ser honrado,
apreciar a natureza, sentir o calor humano e partilhar afeto.
Mas, em geral medicados, padronizados, desesperados, medíocres ou heróicos, amorosos ou perversos, nos achando o máximo ou nos sentindo um lixo,
carregamos a mala da culpa e a mochila da ansiedade.
Refletindo, veríamos que somos apenas humanos, e que nisso existe alguma grandeza.
Mas, convencidos de que pensar dói e de que mudar é negativo, tateamos sozinhos no escuro, manada confusa subindo a escada rolante pelo lado errado.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

A realidade - Clarice Lispector

“Amanheci em cólera.
Não, não, o mundo não me agrada.
A maioria das pessoas estão mortas e não sabem,
ou estão vivas com charlatanismo.
E o amor, em vez de dar, exige.
E quem gosta de nós quer que sejamos
alguma coisa de que eles precisam.
Mentir dá remorso.
E não mentir é um dom que o mundo não merece…”

Sonho - Mário Quintana

“Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo…”

Meus filhos têm passado mais do que futuro - Fabrício Carpinejar

Jogar futebol dentro de casa é um hábito do meu filho. A bola de pano fica cobrindo seu tênis, reforçando o cadarço. Toda porta se converte em uma goleira.
É natural que as esculturas da sala estejam quebradas. A namoradeira na janela foi decapitada. São Francisco de Assis de madeira perdeu seus amigos pássaros. Um pescador viu sua rede e seus peixes levantarem asas. A baiana não segurou o vaso na cabeça. O flautista da Ásia acabou partido em dois.

A sala é um aprumo, uma beleza, com móveis feitos sob medida. O que fazer com as peças danificadas?

Não coloquei nenhuma escultura fora. Colamos os objetos em longa entrega. Chegamos a pintar de novo, escová-los com verniz, exercendo o papel de cirurgião da infância.

Meus dedos estão grudados aos dedos do meu filho de tanto que passeamos pela cola bonder. A textura plastificada não me enerva, é um esmalte transparente da cumplicidade. Coço a mão com impagável orgulho. Como um artesão depois de uma longa trama de cordas. Como um oleiro depois de girar o barro e encontrar as curvas da estrada de Caxias do Sul.

Não posso ensinar aos filhos a não errar. O que me cabe é ajudá-los a restaurar, a dar a volta por cima, a cuidar do estrago e procurar a dignidade da emenda.

Há uma obsessão dos pais de fazer avançar a qualquer custo. De ir para frente, de pular de série, de alcançar a excelência das notas, de profissionalizar o tempo e ocupar os horários para não tropeçar em bobagens. Educar é mandar, ser educado é aceitar ordens.

Tudo é sempre uma única vez, movida a frases sentenciosas “Não irei repetir” ou “Presta atenção”. Quantos meninos e meninas se deprimem por não encontrar uma segunda chance na família?

Penso o contrário. Sinto o contrário.

Compreendo que a criança não poderá voar se não andar primeiro. Mais do que nunca, precisa saber voltar atrás. Ter passado mais do que futuro. Isso significa suportar a frustração, reagir quando as coisas não acontecem como esperadas. Contar com tristeza suficiente para sair da tristeza e se levantar. Mimar é não permitir que nada se quebre. Amar, de outro modo, é reconstituir os estilhaços.

Não penalizar por uma nota ruim com castigo e privação dos prazeres, mas dar a consciência de que o conceito é provisório e que é natural melhorar.

Estimular o pequeno com a própria dificuldade. Recompor o que foi estragado, reconstituir um desenho rasgado, remontar os escombros e não se envergonhar pela demora.

Deixo as esculturas mancas na sala. Não me importo como as visitas vão reagir ou se passarão a me observar com desconfiança. Os defeitos permanecem expostos. A vida é para ser usada.

sábado, 27 de junho de 2009

Ambiente perfeito - Guida Linhares

Tanto faz por onde chegares,
hás de encontrar o lugar.
A mesa posta para o chá!
Podes escolher onde sentar...
eu te acompanharei!
E me falarás do que te incomoda...
tuas tristezas e angústias.
Na fumaça desprendida das xícaras,
tudo será evaporado.

Presença - Mário Quintana

É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento
das horas ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que a tua ausência trescale
sutilmente, no ar, a trevo machucado,
a folhas de alecrim desde há muito guardadas
não se sabe por quem nalgum móvel antigo...
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela
e respirar-te, azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade para eu sentir
como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista
que nunca te pareces com o teu retrato...
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te!

Concerto para Corpo e Alma - Rubem Alves

Compreendi, então,
que a vida não é uma sonata que,
para realizar a sua beleza,
tem de ser tocada até o fim.
Dei-me conta, ao contrário,
de que a vida é um álbum de minissonatas.
Cada momento de beleza vivido e amado,
por efêmero que seja,
é uma experiência completa
que está destinada à eternidade.
Um único momento de beleza e amor
justifica a vida inteira.

Natureza Humana - Vinícius de Moraes

Cheguei.
Sinto de novo a natureza
Longe do pandemônio da cidade
Aqui tudo tem mais felicidade
Tudo é cheio de santa singeleza
Vagueio pela murmura leveza
Que deslumbra de verde e claridade
Mais nada.
Resta vívida a saudade
Da cidade em bulício e febre acesa
Ante a perspectiva da partida
Sinto que me arranca algo da vida
Mas quero ir.
E ponho-me a pensar
Que a vida é esta incerteza que em mim mora
A vontade tremenda de ir-me embora
E a tremenda vontade de ficar.

Para refletir... - Roberto Freire

"Quem começa a entender o amor,
a explicá-lo,
a qualificá-lo
e quantificá-lo,
já não está amando."

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Trecho de Secreta Miranda - Lya Luft


"O medo de perder o que se ama
faz com que avaliemos melhor muitas coisas.
Assim como a doença nos leva a apreciar
o que antes achávamos banal e desimportante.
Diante de uma dor pessoal compreendemos o valor de afetos e interesses
que até então pareciam apenas naturais:
Nós os merecíamos só isso.
Eram parte de Nós.
O amor nos tira o sono,
Nos tira do sério
tira o tapete debaixo dos nossos pés,
faz com que nos defrontemos com medos e fraquezas
aparentemente superados,
Mas também com insuspeita da audácia e generosidade.
E como habitualmente tem um fim
-que é dor- complica a vida.
Por outro lado,
é um maravilhoso ladrão da nossa arrogância.
Quem nos quiser amar agora
terá de vir com calma,
terá de vir com jeito.
Somos um território mais difícil de invadir,
porque levantamos muros,
inseguros de nossas forças
disfarçamos a fragilidade com altas torres e ares imponentes.
A maturidade me permite
olhar com menos ilusões,
aceitar com menos sofrimento,
entender com mais tranquilidade.
Querer com mais doçura."

Realizadores de sonhos - César Souza

Obstinação, tenacidade, perseverança, decisão, persistência, garra ou apenas teimosia? Não importa, todas essas palavras fazem parte da biografia de um realizador de sonhos.
Positivo, ele persegue seus objetivos sem desistir diante das dificuldades. Mas perseverar não significa insistir no erro, caso tenha uma estratégia equivocada para o seu sonho. Ao contrário, em alguns momentos é melhor passar a borracha na estratégia para salvar o sonho.
Nesse caso, persevere no sonho e mude de estratégia.
Os realizadores de sonhos também são capazes de inventar novas soluções para velhos problemas em vez de ficar repetindo as saídas que deram certo no passado.

Eles não se acomodam diante dos obstáculos nem derrotas passageiras. São capazes de transformar a queda em um passo de dança. São criativos na hora de sonhar e na gestão da travessia. Acreditam que uma idéia requer um contexto que fomente a originalidade.
São, também, eternos insatisfeitos e estão sempre buscando mais, como se fosse um vício. Vibram com as conquistas, mas não se acomodam.

Têm um apetite insaciável por informações novas e por diferentes perspectivas.
Olham para as pessoas e situações procurando aperfeiçoar seus conhecimentos.
Tiram lições dos erros e acertos. E, principalmente, os tombos não os intimidam.

in "Você é do tamanho de seus sonhos"


O amor - Chico Buarque


O meu amor
Tem um jeito manso que é só seu
E que me deixa louca
Quando me beija a boca
A minha pele inteira fica arrepiada
E me beija com calma e fundo
Até minh'alma se sentir beijada, ai

O meu amor
Tem um jeito manso que é só seu
Que rouba os meus sentidos
Viola os meus ouvidos
Com tantos segredos lindos e indecentes
Depois brinca comigo
Ri do meu umbigo
E me crava os dentes, ai

Eu sou sua menina, viu?
E ele é o meu rapaz
Meu corpo é testemunha
Do bem que ele me faz
O meu amor
Tem um jeito manso que é só seu
De me deixar maluca
Quando me roça a nuca
E quase me machuca com a barba malfeita
E de pousar as coxas entre as minhas coxas
Quando ele se deita, ai

O meu amor
Tem um jeito manso que é só seu
De me fazer rodeios
De me beijar os seios
Me beijar o ventre
E me deixar em brasa
Desfruta do meu corpo
Como se o meu corpo fosse a sua casa, ai

Eu sou sua menina, viu?
E ele é o meu rapaz
Meu corpo é testemunha
Do bem que ele me faz .

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Aí tem - Martha Medeiros

As coisas são como são.
Se alguém diz que está calmo, é porque está calmo.
Se alguém diz que te ama, é porque te ama.
Se alguém diz que não vai poder sair à noite porque precisa estudar, está explicado.
Mas a gente não escuta só as palavras: a gente ouve também os sinais.
Ele telefonou na hora que disse que ia ligar, mas estava frio como um iglu.
Você falava, falava, e ele quieto, monossilábico.
Até que você o coloca contra a parede:
"O que é que está havendo?".
"Nada, tô na minha, só isso." Só isso???? Aí tem.
Ele telefonou na hora que disse que ia ligar, mas estava exaltado demais.
Não parava de tagarelar. Um entusiasmo fora do comum.
Você pergunta à queima-roupa:
"Que alegria é essa?" "Ué, tô feliz, só isso". Só isso????? Aí tem.
Os tais sinais. Ansiedade fora de hora, mudez estranha, olhar perdido,
mudança no jeito de se vestir, olheiras e bocejos de quem dormiu pouco à noite: aí tem.
Somos doutoras em traduzir gestos, silêncios e atitudes incomuns.
Se ele está calado demais, é porque está pensando na melhor maneira de nos dar uma má notícia. Se está esfuziante demais, é porque andou rolando novidades que você não está sabendo.
Se ele está carinhoso demais, é porque não quer que você perceba
que está com a cabeça em outra.
Se manda flores, é porque está querendo que a gente facilite alguma coisa pra ele.
Se vai viajar com os amigos, é porque não nos ama mais.
Se parou de fumar, é uma promessa que ele não contou pra você.
Enfim, o cara não pode respirar diferente que aí tem.
Às vezes não tem.
O cara pode estar calado porque leu um troço que mexeu com ele,
ou está falando muito porque o time dele venceu.
Pode estar mais carinhoso porque conversou sobre isso na terapia
e pode estar mais produzido porque teve um aumento de salário.
Por que tudo o que eles fazem tem que ser um recado pra gente?
É uma generalização,
mas as mulheres costumam ser mais inseguras que os homens no quesito relacionamento. Qualquer mudança de rota nos deixa em estado de alerta,
qualquer outra mulher que cruze o caminho dele pode ser uma concorrente,
qualquer rispidez não justificada pode ser um cartão amarelo.
O que ele diz importa menos do que sua conduta.
Pobres homens.
Se não estão babando por nós,
se tiram o dia para meditar
ou para assistir um jogo de vôlei na tevê sem avisar com duas semanas de antecedência,
danou-se: aí tem.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

O tempo - José Saramago

" O tempo não é uma corda que se possa medir de nó a nó.
O tempo é uma superfície oblíqua e ondulante
onde só a memória é capaz de se mover e aproximar."

Rifa-se um coração - Clarice Lispector

"Rifa-se um coração
Rifa-se um coração quase novo.
Um coração idealista.
Um coração como poucos.
Um coração à moda antiga.
Um coração moleque que insiste
em pregar peças no seu usuário.
Rifa-se um coração que na realidade está um

pouco usado, meio calejado, muito machucado
e que teima em alimentar sonhos e, cultivar ilusões.
Um pouco inconseqüente que nunca desiste
de acreditar nas pessoas.
Um leviano e precipitado coração
que acha que Tim Maia
estava certo quando escreveu...
"...não quero dinheiro, eu quero amor sincero,é isso que eu espero...".
Um idealista...
Um verdadeiro sonhador...
Rifa-se um coração que nunca aprende.

Que não endurece, e mantém sempre viva a
esperança de ser feliz, sendo simples e natural.
Um coração insensato que comanda o racional
sendo louco o suficiente para se apaixonar.
Um furioso suicida que vive procurando
relações e emoções verdadeiras.
Rifa-se um coração que insiste em cometer

sempre os mesmos erros.
Esse coração que erra, briga, se expõe.
Perde o juízo por completo em nomede causas e paixões.
Sai do sério e, às vezes revê suas posições
arrependido de palavras e gestos.
Este coração tantas vezes incompreendido.
Tantas vezes provocado.Tantas vezes impulsivo.
Rifa-se este desequilibrado emocional

que abre sorrisos tão largos que quase dá pra engolir as orelhas,
mas que também arranca lágrimas
e faz murchar o rosto.
Um coração para ser alugado,
ou mesmo utilizado
por quem gosta de emoções fortes.
Um órgão abestado indicado apenas para
quem quer viver intensamente
contra indicado para os que apenas pretendem
passar pela vida matando o tempo,
defendendo-se das emoções.
Rifa-se um coração tão inocente

que se mostra sem armaduras
e deixa louco o seu usuário.
Um coração que quando parar de bater
ouvirá o seu usuário dizer
para São Pedro na hora da prestação de contas:
"O Senhor pode conferir. Eu fiz tudo certo,
só errei quando coloquei sentimento.
Só fiz bobagens e me dei mal
quando ouvi este louco coração de criança
que insiste em não endurecer e,
se recusa a envelhecer"
Rifa-se um coração,

ou mesmo troca-se por
outro que tenha um pouco mais de juízo.
Um órgão mais fiel ao seu usuário.
Um amigo do peito que não maltrate
tanto o ser que o abriga.
Um coração que não seja tão inconseqüente.
Rifa-se um coração cego, surdo e mudo,

mas que incomoda um bocado.
Um verdadeiro caçador de aventuras que ainda
não foi adotado, provavelmente, por se recusar
a cultivar ares selvagens ou racionais,
por não querer perder o estilo.
Oferece-se um coração vadio,
sem raça, sem pedigree.
Um simples coração humano.
Um impulsivo membro de comportamento
até meio ultrapassado.
Um modelo cheio de defeitos que,
mesmo estando fora do mercado,
faz questão de não se modernizar,
mas vez por outra,
constrange o corpo que o domina.
Um velho coração que convence
seu usuário a publicar seus segredos
e a ter a petulância de se aventurar como poeta."

Te reconheças - Miguel Torga

Recomeça...
Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.
E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças...

Triunfo - Charles Chaplin

Cada um tem de mim exactamente o que cativou,
e cada um é responsável pelo que cativou,
não suporto falsidade e mentira,
a verdade pode machucar, mas é sempre mais digna.
Bom mesmo é ir a luta com determinação,
abraçar a vida e viver com paixão.
Perder com classe e vencer com ousadia,
pois o triunfo pertence a quem mais se atreve
e a vida é muito para ser insignificante.
Eu faço e abuso da felicidade
e não desisto dos meus sonhos.
O mundo está nas mãos
daqueles que tem coragem de sonhar
e correr o risco de viver seus sonhos.

Espelho - Silvia Plath

Sou prateado e exato. Não tenho preconceitos.
Tudo o que vejo engulo no mesmo momento
Do jeito que é, sem manchas de amor ou desprezo.
Não sou cruel, apenas verdadeiro —
O olho de um pequeno deus, com quatro cantos.
O tempo todo medito do outro lado da parede.
Cor-de-rosa, malhada. Há tanto tempo olho para ele
Que acho que faz parte do meu coração. Mas ele falha.
Escuridão e faces nos separam mais e mais.
Sou um lago, agora. Uma mulher se debruça sobre mim,
Buscando em minhas margens sua imagem verdadeira.
Então olha aquelas mentirosas, as velas ou a lua.
Vejo suas costas, e a reflito fielmente.
Me retribui com lágrimas e acenos.
Sou importante para ela. Ela vai e vem.
A cada manhã seu rosto repõe a escuridão.
Ela afogou uma menina em mim, e em mim uma velha
Emerge em sua direção, dia a dia, como um peixe terrível.

terça-feira, 23 de junho de 2009

A vida - Isabel Allende

A vida não é uma fotografia,
em que preparamos as coisas para que fiquem bem
e em seguida fixamos uma imagem para a posterioridade;
é um processo sujo,
desordenado, rápido,
cheio de imprevistos.
A única coisa certa é que tudo muda.

Convivendo com amor - Simone de Beauvoir

"Dois seres que se amam profundamente não precisam de outras justificativas para amar a vida. Bastam-se, não precisam de nada nem de ninguém.
O amor autêntico, que pode ser preservado apesar da passagem dos anos,
dá à vida todo o sentido, toda a sua razão de ser.
Não é a única forma de dar razão à existência (o compromisso social, o sentimento de fazer progredir o mundo em que vivemos, a amizade, etc., também podem construir este sentido), mas pode ser a mais bela razão de viver que existe.
O que me entristece é que o casal permaneça unido pelo hábito, pela pressão social...
Logo que dois seres se sentem ligados não tanto por se amarem,
o que era libertação e plenitude transforma-se em angústia e prisão.
Sartre e eu nunca vivemos juntos e sempre considerámos ser livres de correntes que nos prendessem um ao outro.
Se permanecemos unidos toda a vida, foi porque nos amámos profundamente e porque, livremente, sempre tivemos vontade de estar um com o outro.
E isso é a coisa mais bela que pode acontecer a um ser humano.
O amor dá força e coragem para enfrentar o mundo e a vida, a dois e não a um só. É muito!"

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Desato - Viviane Mosé

É preciso fritar o arroz bastante antes de jogar água fervendo.
E não pode mexer jamais depois de a água ser posta.
O alho deve fritar no óleo junto com o arroz.
Coisas que eu sei e que não. Eu sei muitas coisas.
Faxina por exemplo. Sei limpar uma casa de tal modo
Que não sobra um canto que não tenha sido tocado
Por minhas mãos.
Depois vou sujando. Com muito gosto.
Deixo peças na sala e louças sujas na pia.
Não na mesma hora mas um pouco
Bastante depois volto limpando.
Assim me faço.
Nos objetos que me acompanham.
Gosto de andar nas ruas e comprar coisas
Que vão se arrumando em torno de mim.
Tenho muitas coisas, quero dizer, tenho muitas camadas.
Uma camada de livros outra de sapatos.
Tem a camada de plantas. E toalhas de rosto.
Tenho camadas de cosméticos e de adereços.
Uma camada de nomes e de coisas que vejo.
Tudo ordenado ao meu redor. Em forma de corpo.
Um corpo que me sustenta quando o meu próprio me falta.
Cadeiras são meus ossos. Sapatos são meus braços.
Torneiras em meus poros. Paredes como roupas de inverno.
(Quando toca música em minha casa sai do umbigo)
Descanso recostada nas paredes da casa
Que me guardam como um abraço.
Me abraço quando me derramo na sala.
E na cozinha. Em geral adormeço no quarto.
Tudo em minha casa tem existência.
Todas as coisas significo.
Com os olhos. Ou com as mãos.
Minha casa tem silêncios
Que ás vezes ouço. Em meu corpo
Tem silêncios maiores ainda.
Que às vezes ouço. E faço poemas.
Faço poemas dos silêncios que ouço.

domingo, 21 de junho de 2009

Resistência da dor - Cecília Meirelles

Conheço a residência da dor.
É um lugar afastado,
Sem vizinhos, sem conversa, quase sem lágrimas,
Com umas imensas vigílias diante do céu.
A dor não tem nome,
Não se chama, não atende.
Ela mesma é solidão:
Nada mostra, nada pede, não precisa.
Vem quando quer.
O rosto da dor está voltado sobre um espelho,
Mas não é rosto de corpo,
Nem o seu espelho é do mundo.
Conheço pessoalmente a dor.
A sua residência, longe,
Em caminhos inesperados.
Às vezes sento-me à sua porta, na sombra das suas árvores.
E ouço dizer:“Quem visse, como vês, a dor, já não sofria”.
E olho para ela, imensamente.
Conheço há muito tempo a dor.
Conheço-a de perto.
Pessoalmente.

É preciso não esquecer nada - Cecília Meirelles

É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.
É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.
O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome,
o som da nossa voz,
o ritmo do nosso pulso.
O que é preciso esquecer é o dia carregado de atos,
a idéia de recompensa e de glória.
O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos severos conosco,
pois o resto não nos pertence.

sábado, 20 de junho de 2009

Eu - Clarice Lispector

"Eu não tenho enredo.
Sou inopinadamente fragmentária.
Sou aos poucos.
Minha história é vive r.
E eu só sei viver as coisas quando já as vivi.
Não sei viver, só sei lembrar-me."

Trajetória - Clarice Lispector






"Pois existe a trajetória,



e a trajetória não é apenas um modo de ir.



A trajetória somos nós mesmos."








in "A Paixão Segundo G.H"

Eu - Fernanda Young

Eu? Eu não sou somente boa.
Sou uma pessoa muito bonita.
Generosa e linda – e quem aguentar, aguentou.
Como prêmio, terá meu amor.
Saberá da minha verdade.
Dará boas gargalhadas.
Mas terá que suportar uma boa dose daquilo que sinto.
Pois, apesar de tudo ser diversão, nada é simples.
Nada é pouco quando o mundo é meu.

Vício - Fernanda Young

Não posso mais roer os nervos enquanto as horas passam e você não aparece.
Preciso me poupar.
Nem mais pretendo sofrer, depois, quando você sumir de vez.
Sofrer por amor é pura vaidade.
Vou olhar para retratos meus e, de novo, sentirei orgulho de mim.
Fotos minhas antes de você.
Quando eu ainda não tinha provado desse seu veneno vicioso.
Da saliva que se fez heroína.
Do cheiro que se fez lança-perfume.

in "o Efeito Urano"

Sobre escrever - Fernanda Young

É fácil se conformar em não saber pintar, tocar piano, dançar.
Mas escrever deveria ser um sentido humano,
como a visão, audição e os outros todos.
Eu, por exemplo, trocaria minha audição pelo dom da escrita sem pestanejar.
Imagina que glória suprema: conseguir esclarecer os sentimentos e ainda deixá-los escritos.
Não sei bem por quê,
mas eu sempre achei que as coisas escritas são mais eternas
que qualquer outra forma de arquivar, guardar, registrar, mais que a fotografia.

in 'Carta para alguém bem perto'

Votos de submissão - Fernanda Young

Caso você queira posso passar seu terno,
aquele que você não usa por estar amarrotado.
Costuro as suas meias para o longo inverno...
Use capa de chuva, não quero ter você molhado.
Se de noite fizer aquele tão esperado frio poderei cobrir-lhe com o meu corpo inteiro.
E verás como minha a minha pele de algodão macio, agora quente,
será fresca quando janeiro.
Nos meses de outono eu varro a sua varanda,
para deitarmos debaixo de todos os planetas.
O meu cheiro te acolherá com toques de lavanda
- Em mim há outras mulheres e algumas ninfetas -
Depois plantarei para ti margaridas da primavera
e aí no meu corpo somente você e leves vestidos,
para serem tirados pelo total desejo de quimera.
Os meus desejos irei ver nos teus olhos refletidos.
Mas quando for a hora de me calar e ir embora sei que,
sofrendo, deixarei você longe de mim.
Não me envergonharia de pedir ao seu amor esmola,
mas não quero que o meu verão resseque o seu jardim.
(Nem vou deixar - mesmo querendo - nehuma fotografia.
Só o frio, os planetas, as ninfetas e toda a minha poesia).

Algumas verdades - Fernanda Young

Sei das besteiras que faço
Das besteiras que falo
De onde vêm os hematomas
Dos medos e dos fracassos
Sei o que penso na insônia
Quando dou uma esmola
Quando digo minha glória
E penso nos vestidos
Sei das noites bebidas
Nos copos sujos e sujos
Conheço cada pedaço da rua
Conheço um pouco de tudo
E sei que digo mentira
Quando digo “Sei de tudo”
Falo demais sobre mim
E quando vejo
Já disse
Algumas verdades ...


in "Dores do amor romântico"

O forjado e o real - Nietzshe

"...A última coisa que eu prometeria seria "melhorar" a humanidade. Eu não construo novos idolos;
os velhos que aprendam o que significa ter pé de barro.
Derrubar idolos (minha palavra para ideais) - isto sim é meu oficio.
E realidade foi despojada de seu valor, seu sentido, sua veracidade,
na medida em que se forjou um mundo ideal...
O " mundo verdadeiro" e o "mundo aparente"
- leia-se: o mundo forjado e a realidade..."

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Dores do amor romântico - Fernanda Young

"...Sirvo-lhe como ponte elevadiça.
Subo. Desço.
Entro e saio.
Jamais fico, jamais ao lado.
Somento embaixo, somento em cima.
Olhando para o palácio de cristal
onde os trovadores cantam a minha morte.
Nunca dormiremos juntos.
Talvez como Tristão e Isolda.
Como Romeue Julieta.
Somos arquetípicos,
ridículos, etéreos e nunca comuns.
Comuns são os casais.
Nós não somos nada.
Entretanto belos e eternos: nada.
Belos e eternos nada."

terça-feira, 16 de junho de 2009

Prece pela tolerância - Voltaire


Não é mais aos homens que me dirijo. É à você, Deus de todos os seres,
de todos os mundos e de todos os tempos:
que os erros agarrados à nossa natureza não sejam motivo de nossas calamidades.
Você não nos deu coração para nos odiarmos nem mãos para nos enforcarmos.
Faça com que nos ajudemos mutuamente a suportar o fardo de uma vida penosa e passageira.
Que as pequenas diferenças entre as vestimentas que cobrem nossos corpos,
entre nossos costumes ridículos, entre nossas leis imperfeitas e nossas opiniões insensatas não sejam sinais de ódio e perseguição.
Que aqueles que acedem velas em pleno dia para te celebrar,
suportem os que se contentam com a luz do sol.
Que os que cobrem suas roupas com um manto branco para dizer que é preciso te amar,
não detestem os que dizem a mesma coisa sob um manto negro.
Que aqueles que dominam uma pequena parte desse mundo, e que possuem algum dinheiro, desfrutem sem orgulho do que chamam poder e riqueza e que os outros não os vejam com inveja, mesmo porque você sabe que não há nessas vaidades nem o que invejar nem do que se orgulhar.
Que eles tenham horror à tirania exercida sobre as almas, como também execrem os que exploram a força do trabalho. Se os flagelos da guerra são inevitáveis,
não nos violentemos em nome da paz.
Que possam todos os homens se lembrar que eles são irmãos!"

Pequenas coisas - Gibran K Gibran


"Pois no orvalho de pequenas coisas,

o coração encontra sua manhã

e sente-se refrescado."

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Prosa Patética - Viviane Mosé

Nunca fui de ter inveja, mas de uns tempos pra cá tenho tido.
As mãos dadas dos amantes tem me tirado o sono.
Ontem, desejei com toda força ser a moça do supermercado.
Aquela que fala do namorado com tanta ternura.
Mesmo das brigas ando tendo inveja.
Meu vizinho gritando com a mulher, na casa cheia de crianças,
Sempre querendo, querendo.
Me disseram que solidão é sina e é pra sempre.
Confesso que gosto do espaço que é ser sozinho.
Essa extensão, largura, páramo, planura, planície, região.
No entanto, a soma das horas acorda sempre a lembrança
Do hálito quente do outro. A voz, o viço.
Hoje andei como louca, quis gritar com a solidão,
Expulsar de mim essa Nossa Senhora ciumenta.
Madona sedenta de versos. Mas tive medo.
Medo de que ao sair levasse a imensidão onde me deito.
Ausência de espelhos que dissolve a falta, a fraqueza, a preguiça.
E me faz vento, pedra, desembocadura, abotoadura e silêncio.
Tive medo de perder o estado de verso e vácuo,
Onde tudo é grave e único.
E me mantive quieta e muda.
E mais do que nunca tive inveja.
Invejei quem tem vida reta, quem não é poeta
Nem pensa essas coisas. Quem simplesmente ama e é amado.
E lê jornal domingo. Come pudim de leite e doce de abóbora.
A mulher que engravida porque gosta de criança.
Pra mim tudo encerra a gravidade prolixa das palavras: madrugada, mãe,
Ônibus, olhos, desabrocham em camadas de sentido,
E ressoam como gongos ou sinos de igreja em meus ouvidos.
Escorro entre palavras, como quem navega um barco sem remo.
Um fluxo de líquidos. Um côncavo silêncio.
Clarice diz que sua função é cuidar do mundo.
E eu, que não sou Clarice nem nada, fui mal forjada,
Não tenho bons modos nem berço.
Que escrevo num tempo onde tudo já foi falado, cantado, escrito.
O que o silêncio pode me dizer que já não tenha sido dito?
Eu, cuja única função é lavar palavra suja,
Neste fim de século sem certezas?
Eu quero que a solidão me esqueça.

domingo, 14 de junho de 2009

Acontecimento - Cecília Meirelles

AQUI estou,
junto à tempestade,
chorando como uma criança
que viu que não eram verdade
o seu sonho e a sua esperança.
A chuva bate-me no rosto
e em meus cabelos sopra o vento.
Vão-se desfazendo em desgôsto
as formas do meu pensamento.
Chorarei toda a noite, enquantoperpassa o tumulto nos ares,
para não me veres em pranto,
nem saberes, nem perguntares:
«Que foi feito do teu sorriso,que era tão claro e tão perfeito?»
E o meu pobre olhar indeciso
não te repetir:
«Que foi feito...?»

in 'Viagem'

Certeza - Fernando Sabino

De tudo, ficaram três coisas:
A certeza de que estamos sempre começando...
A certeza de que precisamos continuar...
A certeza de que seremos interrompidos antes de terminar...
Portanto devemos:
Fazer da interrupção um caminho novo...
Da queda um passo de dança...
Do medo, uma escada...
Do sonho, uma ponte...
Da procura, um encontro...

Amor e suas faces - Pe. Fábio de Melo


" Queremos o valor da moeda
mas não queremos suas duas faces.
Talvez seja por isso que o amor
tem sido reduzido ao horizonte das paixões,
e nisso consiste a gênese de tantos medos,
sofrimentos e frustrações."

Em mutação - Nietzsche

"Tudo vai, tudo volta;
eternamente gira a roda do ser.
Tudo morre, tudo refloresce,
eternamente transcorre o ano do ser.
Tudo se desfaz, tudo é refeito;
eternamente constrói-se a mesma casa do ser.
Tudo se separa, tudo volta a se encontrar;
eternamente fiel a si mesmo permanece o anel do ser.
Em cada instante começa o ser;
em torno de todo o "aqui” rola a bola "acolá”.
O meio está em toda parte.
Curvo é o caminho da eternidade."

Uma estrela - Mário Quintana

Foram-se abrindo aos poucos as estrelas...
De margaridas lindo campo em flor!
Tão alto o Céu!...
Pudesse eu ir colhê-las...
Diria alguma se me tens amor.
Estrelas altas!
Que se importam elas?
Tão longe estão...
Tão longe deste mundo...
Trêmulo bando de distantes velas
Ancoradas no azul do céu profundo...
Porém meu coração quase parava,
Lá foram voando as esperanças minhas
Quando uma, dentre aquelas estrelinhas,
Deus a guie! do céu se despencou...
Com certeza era o amor que tu me tinhas
Que repentinamente se acabou!

A vida - Gabriel Garcia Marquez

"A vida não é a que cada um viveu,
mas a que recorda
e como a recorda para contá-la."

in Viver para contá-la

Minha necessidade - Caio F abreu

Que coisas são essas que me dizes sem dizer,
escondidas atrás do que realmente quer dizer?
Tenho me confundido na tentativa de te decifrar, todos os dias.
Mas confuso, perdido, sozinho,
Minha única certeza é que de cada vez aumenta ainda mais minha necessidade de ti.
Torna-se desesperada, urgente.
Eu já não sei o que faço.
Não sinto nenhuma outra alegria além de ti.
Como pude cair assim nesse fundo poço?
Quando foi que me desequilibrei?
Não quero me afogar: Quero beber tua água.
Não te negues, minha sede é clara.

Escrever... - Clarice Lispector

"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa.
Não altera em nada...
Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas.
A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..."

sábado, 13 de junho de 2009

Totalidade - Osho

"Não se preocupe com a perfeição.
Substitua a palavra "perfeição" por "totalidade".
Não pense que você tem de ser perfeito,
pense que tem de ser total.
A totalidade dá a você uma dimensão diferente."

Seja mais interessante que bonita ! - Nelson Rodrigues

Na "mulher interessante", a beleza é secundária, irrelevante e, mesmo, indesejável.
A beleza interessa nos primeiros quinze dias; e morre, em seguida,
num insuportável tédio visual.
Era preciso que alguém fosse, de mulher em mulher, anunciando:
- "Ser bonita não interessa. Seja interessante!"

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Eu - Florbela Espanca

Eu sou a que no mundo anda perdida,
eu sou a que na vida não tem norte,
sou a irmã do sonho, e desta sorte.
Sou a crucificada... a dolorida...
Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber por quê...
Sou talvez a visão que alguém sonhou,
alguém que veio ao mundo pra me ver,
e que nunca na vida me encontrou!

Saudade - Rubem Alves

"A saudade é a nossa alma dizendo para onde ela quer voltar."

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Simples - Pe. Fábio de Melo

Tudo o que é belo tende a ser simples. Afirmação generalizante? Não sei.
O que sei é que a beleza anda de braços dados com a simplicidade.
Basta observar a lógica silenciosa que prevalece nos jardins.
Vida que se ocupa de ser só o que é.
Simplicidade é um conceito que nos remete ao estado mais puro da realidade.
A semente é simples porque não se perde na tentativa de ser outra coisa.
É o que é. Não desperdiça seu tempo querendo ser flor antes da hora.
Cumpre o ritual de existir, compreendendo-se em cada etapa.
Tenho uma intuição de que quando eu simplificar a minha vida,
a felicidade chegará em minha casa, quando eu menos esperar.

( Trechos do texto Simplifique Sua vida)

Antes do seu tempo - Cora Coralina

Tudo que criei e defendi
nunca deu certo.
Nem foi aceito.
E eu perguntava a mim mesma
Por quê?
Quando menina,
ouvia dizer sem entender
quando coisa boa ou ruim acontecia a alguem:
Fulano nasceu antes do tempo.
Guardei
Tudo que criei, imaginei e defendi
nunca foi feito.
E eu dizia como ouvia
a moda de consolo:
Nasci antes do tempo.
Alguém me retrucou.
Você nasceria sempre
antes do seu tempo.
Não entendi e disse Amém.

Reflexo - Pablo Nerruda

Se sou amado, quanto mais amado mais correspondo ao amor..
Se sou esquecido,
devo esquecer também,
pois amor é feito espelho:- tem que ter reflexo!

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Atos e consequências - José Saramago

"Se podes olhar vê, se podes ver, repara.…
se antes de cada ato nosso,
nos puséssemos a prever todas as consequências dele,
a pensar nelas a sério,
primeiro as imediatas,
depois as prováveis,
depois as possíveis,
depois as imagináveis,
não chegaríamos sequer a mover-nos
de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar."

in Ensaio sobre a cegueira

Paixões - Voltaire

"As paixões são como ventanias
que enfunam as velas dos navios,
fazendo-os navegar;
outras vezes podem fazê-los naufragar,
mas se não fossem elas,
não haveria viagens
nem aventuras nem novas descobertas."

Virtudes e vícios - Sêneca


"A virtude é difícil de se manifestar,

precisa de alguém para orientá-la e dirigi-la.


Mas os vícios são aprendidos sem mestre".