segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Os Degraus - Mario Quintana

Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...

in "Quintana de Bolso - Coletânea - pág. 93"

Da condição Humana - Mario Quintana

Se variam na casca, idêntico é o miolo.
Julguem-se embora de diversa trama:
Ninguém mais se parece a um verdadeiro tolo
Que o mais sutil dos sábios quando ama.

in "Quintana de Bolso - Coletânea - pág.42"

De como perdoar aos inimigos - Mario Quintana

Perdoas... és cristão... bem o compreendo...
E é mais cômodo, em suma.
Não desculpes, porém, coisa nenhuma,
Que eles bem sabem o que estão fazendo...

in "Quintana de Bolso - Coletânea - pág.41"

Da eterna procura - Mario Quintana

Só o desejo inquieto, que não passa
Faz o encanto da coisa desejada...
E terminamos desdenhando a caça
Pela doida aventura da caçada.

in "Quintana de Bolso - Coletânea - pág.37"

Dos sistemas - Mario Quintana

Já trazes, ao nascer, tua filosofia.
As razões? Essas vêm posteriormente,
Tal como escolhes, na chapelaria,
a fôrma que mais te assente...

in "Quintana de Bolso - Coletânea - pág.38"

Das ilusões - Mario Quintana

Meu saco de ilusões, bem cheio tive-o.
Com ele ia subindo a ladeira da vida.
E, no entretanto, após cada ilusão perdida...
Que extraordinária sensação de alívio !

in "Quintana de Bolso - Coletânea - pág.37"

Da observação - Mario Quintana

Não te irrites, por mais que te fizerem...
Estuda, a frio, o coração alheio.
Farás, assim, do mal que eles te querem,
Teu mais amável e sutil recreio...

in "Quintana de Bolso - Coletânea - pág. 35"

Irrealidade - Caio F Abreu



Me pergunto sempre
se não teceste a minha volta
uma porção de coisas irreais.

Continuar - Caio F Abreu

Não se preocupe, não vou tomar nenhuma medida drástica,
a não ser continuar,
tem coisa mais destrutiva que insistir sem fé nenhuma?

Ah, passa devagar a tua mão na minha cabeça,
toca meu coração com teus dedos frios,
eu tive tanto amor um dia.

A morte e o amor - Caio F Abreu

“Somos todos imortais.
Teoricamente imortais, claro.
Hipocritamente imortais.
Porque nunca consideramos a morte como uma possibilidade cotidiana,
feito perder a hora no trabalho ou cortar-se fazendo a barba, por exemplo.
Na nossa cabeça, a morte não acontece como pode acontecer de eu discar um número telefônico e, ao invés de alguém atender, dar sinal de ocupado.
A morte, fantasticamente, deveria ser precedida de certo ‘clima’, certa ‘preparação’.
Certa ‘grandeza’. Deve ser por isso que fico (ficamos todos, acho) tão abalado quando,
sem nenhuma preparação, ela acontece de repente.
E então o espanto e o desamparo, a incompreensão também,
invadem a suposta ordem inabalável do arrumado (e por isso mesmo ‘eterno’) cotidiano.
A morte de alguém conhecido e/ou amado estupra essa precária arrumação,
essa falsa eternidade.
A morte e o amor.
Porque o amor, como a morte, também existe – e da mesma forma, dissimulada.
Por trás, inaparente. Mas tão poderoso que, da mesma forma que a morte
– pois o amor também é uma espécie de morte
(a morte da solidão, a morte do ego trancado,
indivisível, furiosa e egoisticamente incomunicável) – nos desarma.
O acontecer do amor e da morte desmascaram nossa patética fragilidade.”

domingo, 27 de fevereiro de 2011

O que o vento não levou - Mario Quintana

No fim tu há sde ver que as coisas mais leves são as
únicas
que o vento não conseguiu levar:

um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento...

in " Quintana de Bolso - Coletânea - pág. 156"

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Quem ama inventa - Mario Quintana

Quem ama inventa as coisas a que ama...
Talvez chegaste quando eu te sonhava.
Então de súbito acendeu-se a chama !
Era a brasa dormida que acordava...
E era um revoô sobre a ruinaria,
No ar atônito bimbalhavam sinos,
Tangidos por uns anjos peregrinos
Cujo dom é fazer ressureições...
Um ritmo divino? Oh! Simplesmente
O palpitar de nossos corações
Batendo juntos e festivamente,
Ou sozinhos, num ritmo tristonho...
Ó! meu pobre, meu grande amor distante,
Nem sabes tu o bem que faz à gente
Haver sonhado... e ter vivido o sonho!

in "Quintana de bolso - Coletânea - pág. 139"

Carta - Mario Quintana

Eu queria trazer-te uma imagem qualquer
para os teus anos...
Oh! mas apenas este vazio doloroso
de uma sala de espera ondenão está ninguém...
É que,
longe de ti, de tuas mãos milagrosas
de onde os meus versos voavam - pássaros de luz
a que deste vida com o teu calor -
é que longe de ti eu me sinto perdido
- sabes? -
desertamente perdido de mim !
Em vão procuro...
mas só vejo de bom, mas só vejo de puro
este céu que eu aviso da minha janela.
E assim, querida,
eu te mando este céu, todo este céu de Porto Alegre
e aquela
nuvenzinha
que está sonhando, agora, em pleno azul!

in "Quintana de Bolso - Coletânea - pág. 131"

Para refletir - Mário Quintana

Quem disse que eu me mudei?

Não importa que a tenham demolido:
A gente continua morando na velha casa
em que nasceu.

in "Quintana de Bolso" pág. 121

Fragmento de Clarice Lispector


"Decifra-me, mas não conclua!
eu posso te surpreender..."

Perda - Gabriel Garcia Marques


"(...) os amputados sentem dores, cãibras, cócegas, na perna que não têm mais.

Assim se sentia ela sem ele, sentindo que ele estava onde não mais se encontrava."
in "O amor nos tempos do cólera" Pág 346

Sou da esperança - Ariano Suassuna

Eu digo sempre que das três virtudes teologais chamadas,
eu sou fraco na fé e fraco na qualidade,
só me resta a esperança.
Eu sou o homem da esperança.

O amor - Maiakóvski


Não acabarão nunca com o amor,
nem as rusgas,
nem a distância.
Está provado,
pensado,
verificado.
Aqui levanto solene
minha estrofe de mil dedos
e faço o juramento:
Amo
firme,
fiel
e verdadeiramente.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Mudei... - Caio F Abreu

"Mudei muito,
e não preciso que acreditem na minha mudança
para que eu tenha mudado."

Amar - Machado de Assis

Cada qual sabe amar a seu modo;
o modo pouco importa;
o essencial é que saiba amar.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Sentimentos em notas - Martha Medeiros

se vivo só
é marcha-a-ré
se nego o sol
só penso em mi
se sofro lá
ninguém tem dó
se você fá
eu quero si

in "Poesia reunida" pág 31

... - Martha Medeiros

jantamos, recolhemos a louça
desta vez não brindamos
não houve conhaque ou licor
nem beijo de boa noite nem amor
hoje é domingo
mas amanheceu segunda-feira prá nós dois

in "Poesia Reunida" pág. 140

sábado, 12 de fevereiro de 2011

O elogio do conhecimento - Francis Bacon

"Meu elogio será dedicado à própria mente.
A mente é o homem, e o conhecimento é a mente;
um homem é apenas aquilo que ele sabe.
(...) Não são os prazeres das afeições maiores do que os prazeres dos sentidos,
e não são os prazeres do intelecto maiores do que os prazeres das afeições?
Não se trata, apenas, de um verdadeiro e natural prazer do qual não há saciedade?
Não é só esse conhecimento que livra a mente de todas as perturbações?
Quantas coisas existem que imaginamos não existirem?
Quantas coisas estimamos e valorizamos mais do que são?
Essas vãs imaginações, essas avaliações desproporcionadas,
são as nuvens do erro que se transformam nas tempestades das perturbações.
Existirá, então, felicidade igual à possibilidade da mente do homem elevar-se
acima da confusão das coisas de onde ele possa ter uma atenção especial
para com a ordem da natureza e o erro dos homens?
De contentamento e não de benefício?
Será que não devemos perceber tanto a riqueza do armazém
da natureza quanto a beleza de sua loja?
Será estéril a verdade?
Não poderemos, através dela,
produzir efeitos dignos
e dotar a vida do homem com uma infinidade de coisas úteis?" ."


in "O Elogio do Conhecimento" (1592)

Presente determinante - Simone de Beauvoir


"O presente não é um passado em potencial.
é o momento da escolha e da ação. "

Promessa - Caio F Abreu

Para refletir - Guimarães Rosa


"Viver é um rasgar-se e remendar-se."


Mentiras - Florbela Espanca


"Tu julgas que eu não sei que tu mentes
Quando o teu doce olhar poisa no meu?
Pois julgas que eu não sei o que tu sentes?
Qual a imagem que alberga o peito teu?

Ai, se o sei, meu amor! Eu bem destingo
O bom sonho da feroz realidade...
Não palpita d’amor, um coração
Que anda vogando em ondas de saudade!

Embora mintas bem, não te acredito;
Perpassa nos teus olhos desleais,
O gelo do teu peito de granito...

Mas finjo-me enganada, meu encanto,
Que um engano feliz vale bem mais
Que um desengano que nos custa tanto!"

Rústica - Florbela Espanca

Ser a moça mais linda do povoado,
Pisar, sempre contente o mesmo trilho.
Ver descer sobre o ninho aconchegado
a benção do senhor em cada filho.

Um vestido de chita bem lavado,
cheirando a alfazema e a tomilho...
Com o luar matar a sede ao gado,
Dar às pombas o sol num grão de milho...

Ser pura como a água da cisterna,
Ter confiança numa vida eterna,
Ao descer a "terra da verdade"...

Meu Deus, dai-me esta calma, esta pobreza!
Dou por elas meu trono de princesa,
e todos os meus Reinos de Ansiedade.

Fanatismo - Florbela Espanca

Minhálma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és se quer razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio do Fim!..."

sábado, 5 de fevereiro de 2011

O tempo e o vento - Mário Quintana


Havia uma escada que parava de repente no ar
Havia uma porta que dava para não se sabe o quê
Havia um relógio onde a morte tricotava o tempo

Mas havia um arroio correndo entre os dedos buliçosos dos pés
E pássaros pousados na pauta dos fios de telégrafo

E o vento!

O vento vinha desde o principio do mundo
Estava brincando com seus cabelos...