domingo, 23 de dezembro de 2012

O ciúme - Rubem Alves

" Ela tinha a beleza tranquila da maturidade.
 Alguns fios de cabelo branco davam ao seu rosto um encanto especial.
 De hábitos domésticos e simples, um de seus prazeres era assentar-se numa poltrona e entrar na bolha que a leitura cria. 
Quem lê está num outro mundo, muito distante.
O marido a observava de longe. Olhos que observam são aqueles que olham quando o outro não está olhando. Seu olhar era o de apaixonado que desconfia, olhar de ciúme. Os olhos do ciumento vigiam. 
Vigiam gestos, movimentos, horas, sorrisos. 
Vigiam porque as modulações silenciosas e distraídas da pessoa amada podem conter revelações sobre aquilo que ela esta pensando. 
O ciumento suspeita que o ser amado lhe esconda alguma coisa. 
Olha na esperança de ver algo escondido, de entrar dentro do segredo do outro. O ciumento detesta os pensamentos. 
Por mais que os vigie, eles estão além de sua vigilância.
Ele queria adivinhar seus pensamentos.
 E a sua vigilância se exacerbava quando ela sorria ou ria. 
Como explicar este sorriso se ele, o marido, não estava dentro do livro? 
Ela não precisava dele pra ser feliz. 
Porque ali, mergulhada no livro, o marido não existia..."

"O ciúme nasce quando se toma consciência de que a pessoa amada é livre. Ela é um pássaro pousado no ombro. 
Nada o prende. Pode voar quando quiser."

   Extraido do livro: Cantos do pássaro encantado            

2 comentários:

Elliana Garcia disse...

Rubem Alves....amo demais...
bjs.

Unknown disse...

Me deliciando com suas postagens!!

Falando em delicias...venha dividir um panetone comigo!!!

Feliz Natal
saúde e paz


Ro