
Já escrevi sobre essa frase. Sim, repito alguns temas, que são parte do meu repertório,
pois todo escritor, todo pintor, tem seus temas recorrentes.
No alto dessa escada nos seduzem novidades e nos angustia o excesso de ofertas.
Para baixo nos convocam a futilidade, o desalento ou o esquecimento nas drogas.
Na dura obrigação de ser "felizes", embora ninguém saiba o que isso significa, nossos enganos nos dirigem com mão firme numa trilha de contradições.
Apregoa-se a liberdade, mas somos escravos de mil deveres. Oferecem-nos múltiplos bens, mas queremos mais. Em toda esquina novas atrações, e continuamos insatisfeitos. Desejamos permanência, e nos empenhamos em destruir.
Nós nos consideramos modernos, mas sufocamos debaixo dos preconceitos, pois esta nossa sociedade, que se diz libertária,
é um corredor com janelinhas de cela onde aprisionamos corpo e alma.
A gente se imagina moderno, mas veste a camisa de força da ignorância e da alienação,
na obrigação do "ter de":
ter de ser bonito, rico, famoso, animadíssimo, ter de aparecer – que canseira.
Como ficcionista, meu trabalho é inventar histórias; como colunista, é observar a realidade,
ver o que fazemos e como somos. A maior parte de nós nasce e morre sem pensar em nenhuma das questões de que falei acima, ou sem jamais ouvir falar nelas.
Questionar dá trabalho, é sem graça, e não adianta nada, pensamos.
Tudo parece se resumir em nascer, trabalhar, arcar com dívidas financeiras e emocionais,
lutar para se enquadrar em modelos absurdos que nos são impostos.
Às vezes, pode-se produzir algo de positivo, como uma lavoura, uma família, uma refeição,
um negócio honesto, uma cura, um bem para a comunidade, um gesto amigo.
Mas cadê tempo e disposição, se o tumulto bate à nossa porta, os desastres se acumulam
– a crise e as crises, pouca trégua e nenhuma misericórdia.
Angústias da nossa contraditória cultura: nunca cozinhar foi tão chique, nunca houve tantas delícias, mas comer é proibido, pois engorda ou aumenta o colesterol.
Nunca se falou tanto em sexo, mas estamos desinteressados, exaustos demais, com medo de doenças. O jeito seria parar e refletir, reformular algumas coisas, deletar outras – criar novas, também. Mas, nessa corrida, parar para pensar é um luxo, um susto, uma excentricidade, quando devia ser coisa cotidiana como o café e o pão.
Para alguns, a maioria talvez, refletir dá melancolia,
ficar quieto é como estar doente, é incômodo, é chato:
"Parar para pensar? Nem pensar! Se fizer isso eu desmorono".
Para que questionar a desordem e os males todos, para que sair da rotina e querer descobrir um sentido para a vida, até mesmo curtir o belo e o bom, que talvez existam? Pois, se for ilusão, a gente perdeu um precioso tempo com essa bobajada, e aí o ônibus passou, o bar fechou, a festa acabou, a mulher fugiu, o marido se matou, o filho... nem falar.
Então vamos ao nosso grande recurso: a bolsinha de medicamentos. A pílula para dormir e a outra para acordar, a pílula contra depressão (que nos tira a libido) e a outra para compensar isso (que nos rouba a naturalidade), e aquela que ninguém sabe para que serve, mas que todo mundo toma. Fingindo não estar nem aí, parecemos modernos e espertos, e queremos o máximo: que para alguns é enganar os outros; para estes, é grana e poder, beleza e prestígio;
para aqueles, é delírio e esquecimento.
Para uns poucos, é realizar alguma coisa útil, ser honrado,
apreciar a natureza, sentir o calor humano e partilhar afeto.
Mas, em geral medicados, padronizados, desesperados, medíocres ou heróicos, amorosos ou perversos, nos achando o máximo ou nos sentindo um lixo,
carregamos a mala da culpa e a mochila da ansiedade.
Refletindo, veríamos que somos apenas humanos, e que nisso existe alguma grandeza.
Mas, convencidos de que pensar dói e de que mudar é negativo, tateamos sozinhos no escuro, manada confusa subindo a escada rolante pelo lado errado.
ter de ser bonito, rico, famoso, animadíssimo, ter de aparecer – que canseira.
Como ficcionista, meu trabalho é inventar histórias; como colunista, é observar a realidade,
ver o que fazemos e como somos. A maior parte de nós nasce e morre sem pensar em nenhuma das questões de que falei acima, ou sem jamais ouvir falar nelas.
Questionar dá trabalho, é sem graça, e não adianta nada, pensamos.
Tudo parece se resumir em nascer, trabalhar, arcar com dívidas financeiras e emocionais,
lutar para se enquadrar em modelos absurdos que nos são impostos.
Às vezes, pode-se produzir algo de positivo, como uma lavoura, uma família, uma refeição,
um negócio honesto, uma cura, um bem para a comunidade, um gesto amigo.
Mas cadê tempo e disposição, se o tumulto bate à nossa porta, os desastres se acumulam
– a crise e as crises, pouca trégua e nenhuma misericórdia.
Angústias da nossa contraditória cultura: nunca cozinhar foi tão chique, nunca houve tantas delícias, mas comer é proibido, pois engorda ou aumenta o colesterol.
Nunca se falou tanto em sexo, mas estamos desinteressados, exaustos demais, com medo de doenças. O jeito seria parar e refletir, reformular algumas coisas, deletar outras – criar novas, também. Mas, nessa corrida, parar para pensar é um luxo, um susto, uma excentricidade, quando devia ser coisa cotidiana como o café e o pão.
Para alguns, a maioria talvez, refletir dá melancolia,
ficar quieto é como estar doente, é incômodo, é chato:
"Parar para pensar? Nem pensar! Se fizer isso eu desmorono".
Para que questionar a desordem e os males todos, para que sair da rotina e querer descobrir um sentido para a vida, até mesmo curtir o belo e o bom, que talvez existam? Pois, se for ilusão, a gente perdeu um precioso tempo com essa bobajada, e aí o ônibus passou, o bar fechou, a festa acabou, a mulher fugiu, o marido se matou, o filho... nem falar.
Então vamos ao nosso grande recurso: a bolsinha de medicamentos. A pílula para dormir e a outra para acordar, a pílula contra depressão (que nos tira a libido) e a outra para compensar isso (que nos rouba a naturalidade), e aquela que ninguém sabe para que serve, mas que todo mundo toma. Fingindo não estar nem aí, parecemos modernos e espertos, e queremos o máximo: que para alguns é enganar os outros; para estes, é grana e poder, beleza e prestígio;
para aqueles, é delírio e esquecimento.
Para uns poucos, é realizar alguma coisa útil, ser honrado,
apreciar a natureza, sentir o calor humano e partilhar afeto.
Mas, em geral medicados, padronizados, desesperados, medíocres ou heróicos, amorosos ou perversos, nos achando o máximo ou nos sentindo um lixo,
carregamos a mala da culpa e a mochila da ansiedade.
Refletindo, veríamos que somos apenas humanos, e que nisso existe alguma grandeza.
Mas, convencidos de que pensar dói e de que mudar é negativo, tateamos sozinhos no escuro, manada confusa subindo a escada rolante pelo lado errado.